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M8: Quando a Morte Socorre a Vida

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Filme da Semana The Movie Club

M8: Quando a Morte Socorre a Vida

“M8” é um filme lançado em 2019, com direção de Jeferson De e roteiro do próprio diretor junto com Cristiane Arenas, Iafa Britz, Carolina Castro, Paulo LinsFelipe Sholl  . O longa-metragem explora os gêneros Drama, Suspense, Mistério e com um ou outro elemento do Terror. Apesar dos gêneros que podem sugerir uma trama manjada, o roteiro faz o caminho contrário. M8 teve várias oportunidades em utilizar efeitos sonoros com jumpscare, mas optou pelo silêncio. Além disso, em vez de se apoiar no horror gráfico, o filme opta pela simplicidade, evitando aterrorizar o espectador em momentos de aparições sobrenaturais.

A história de “M8” gira em torno da jornada de Maurício (interpretado por Juan Paiva) ao ingressar na faculdade de Medicina e iniciar as aulas de Anatomia. Nesse ambiente acadêmico, Maurício se depara com duas experiências marcantes. A primeira, ser o único estudante negro em meio a uma maioria de pessoas de pele clara. A segunda, confrontar a perturbadora realidade de que os outros negros presentes no local são cadáveres a serem estudados.

Ao conhecer o cadáver M8 (interpretado por Raphael Logam), Maurício  é levado para uma série de questionamentos. A confusão de um colega, que o enxerga como um funcionário da universidade, já revela o racismo estrutural presente na sociedade. Observar que só há corpos negros, nos dá uma dimensão ainda mais gritante da violência crônica contra a população preta no Brasil.

O longa-metragem “M8: Quando a Morte Socorre a Vida” tem o protagonista Maurício como condutor do espectador na trama, apresentando a missão GLO (Garantia da Lei e da Ordem) de 2018 no Rio de Janeiro, a comoção e protestos de parentes de jovens desaparecidos e a violência policial. Os roteiristas acertaram na escolha do elo de ligação entre Maurício e M8 ser uma religião de matriz africana. Afinal, as religiões descendentes de raízes africanas ainda são bastante demonizadas no Brasil, sofrendo todos os tipos de ataques simbólicos e físicos.

“M8” poderia ser apenas um Drama, mas opta por um Terror psicológico, tanto em seus trechos com as aparições do homem conhecido apenas como M8, onde Maurício precisa urgentemente descobrir a origem daquele cadáver que um dia teve um nome, uma família, uma vida. O gênero que explora um desconforto psicológico também pode ser sentido na cena em que Maurício sofre violência policial. Se não fosse a intervenção dos colegas, quem garante que Maurício não se “transformaria” num M9?

“M8: Quando a Morte Socorre a Vida” apresenta um elenco super talentoso. Tanto com o núcleo mais jovem, como Bruno Peixoto (Domingos), Giulia Gayoso (Suzana), Mariana Nunes (Cida), Fábio Beltrão (Gustavo) e o próprio Juan Paiva. O diálogo entre o núcleo mais jovem e o núcleo veterano do filme ficou por conta do personagem principal. As presenças marcantes dos dois funcionários da universidade (Aílton Graça e Alan Rocha), bem como Zezé Motta (Ilza), Léa Garcia (Dona Ângela) e Pietro Mário (Salomão), também foram extremamente positivas. O ponto negativo foi a minúscula participação de Lázaro Ramos, que apareceu somente para interpretar o motorista de um carro funerário.

M8 é apenas um código de identificação de um cadáver de uma faculdade de Medicina. Mas por trás daquele corpo há uma história de vida. E num país onde o racismo estrutural é muito forte, corpos negros sem identificações, são apenas indigentes em laboratórios de faculdades e necrotérios tornando-se apenas siglas, letras, números e estatísticas. E, para além da ficção, o filme é totalmente condizente com a realidade enfrentada pela população negra, pobre e periférica do país.

A nota técnica do IPEA (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) “Vidas Perdidas e Racismo no Brasil” demonstra que, segundo o Censo Demográfico de 2010, enquanto a taxa de homicídios de negros do Brasil é de 36 mortes por 100 mil negros, a mesma medida para os “não negros” é de 15,2. Num país com enormes contrastes, onde negros têm muito mais chances de serem vítimas de mortes violentas, o lamento de Elza Soares na música “A Carne” afirma que “a carne mais barata do mercado é a carne negra”. A metáfora da música revela uma realidade cruel: numa sociedade capitalista, desigual, e através de uma visão de mercado, infelizmente as vidas negras são as que menos importam.

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